Comunicado de imprensa para A Mensagem
Existe uma crise de habitação a nível global, mas que afeta Lisboa com grande intensidade. Segundo o INE, no período 2014-2020, o preço da habitação em Lisboa aumentou 118%, sendo este aumento ainda mais significativo no centro da cidade, onde, por exemplo, na freguesia de Santo António o acréscimo foi de 220%. Lisboa é a cidade europeia onde mais aumentou o preço da habitação nos últimos anos. Tendo em conta os baixos salários, e segundo o Banco Central Alemão, estes aumentos fazem de Lisboa a cidade europeia onde é mais difícil aceder a uma casa. Lisboa é a cidade com a taxa de esforço - relação entre salários e preço da habitação - mais elevada da Europa, e ocupa a sexta posição mundial neste alarmante ranking.
Além dos dados, a crise da habitação em Lisboa é bem conhecida da população, para quem a batalha diária é para não sermos expulsos da casa que habitamos ou para encontrarmos uma casa digna. Dado que os poderes políticos têm promovido medidas que fundamentalmente estimulam a especulação imobiliária em detrimento do direito à habitação, é obrigação da cidadania organizar-se para garantir que possamos ter um futuro na cidade. É por este motivo que constituímos o Movimento Referendo pela Habitação.
O Movimento Referendo pela Habitação tem dois objetivos. O primeiro, e mais óbvio, é implementar um referendo local em Lisboa pelo direito à habitação. Para isso, iremos recolher 5 mil assinaturas e levar a nossa proposta a votação de âmbito municipal. O segundo objetivo é criar movimento para a construção de reivindicações de mudança em Lisboa no que toca à questão da habitação. Isto significa que queremos convidar, em geral, toda a população da cidade, e, em particular, todas as pessoas que se sentem ameaçadas pela especulação imobiliária em Lisboa a juntarem-se a este movimento.
Segundo os últimos censos, Lisboa tem mais casas do que famílias residentes, o que significa que em teoria existem “casas de sobra” para toda a gente. Significa, também, que não enfrentamos um problema de oferta, como políticos de diversos partidos e os lobbies imobiliários nos querem fazer crer, mas que enfrentamos um problema de uso indevido das habitações existentes para outros fins. Esta situação deve ser revertida imediatamente. E neste sentido, destaca-se o uso para alojamento local.
É importante notar que o aumento no preço da habitação em Lisboa coincide com a implementação do Regime Jurídico de Exploração dos Estabelecimentos de Alojamento Local de 2014. No período 2014-2020, foram concedidas 20.000 licenças para alojamento local em Lisboa. Este uso turístico da habitação atingiu níveis que consideramos inaceitáveis: na freguesia de Santa Maria Maior, mais de 60% da habitação disponível está dedicada ao alojamento local; na freguesia da Misericórdia, é quase 40%; na freguesia de Santo António, cerca de 30%; e na freguesia de São Vicente, perto de 20%.
O Movimento Referendo pela Habitação pretende mudar o regulamento municipal do alojamento local para impedir que esta atividade especulativa possa existir em prédios com licença para uso habitacional. Consideramos necessária a alteração do regulamento de forma a prever que não seja possível que uma atividade de serviços, com as características do alojamento local, ocupe um espaço destinado à habitação. Os imóveis com autorização de utilização para habitação devem cumprir a sua função social: serem habitados.
Habitar implica permanecer no espaço, imbuí-lo de vivências quotidianas, construir comunidade, decidir sobre a cidade. O alojamento local, neste nível de expressão tão desmesurado, não nos oferece nenhuma destas possibilidades. Pelo contrário, contribui para a expulsão da população residente, para o desmantelamento de relações de vizinhança, e para a desvitalização dos nossos bairros, que se enchem de consumidores temporários cujo principal objetivo é a diversão. Não é esta a cidade que queremos.
O movimento Referendo pela Habitação é um movimento apartidário: não nasceu de nenhum partido, nem pretende fazer a luta política nos meios institucionais, que já provaram ser incapazes de resolver o problema da habitação na cidade. A ideia é mobilizarmo-nos nos nossos bairros e organizarmos a transformação de Lisboa pelas nossas próprias mãos. Somos um grupo de pessoas ativas em Lisboa (algumas residentes, outras não; algumas já expulsas da cidade…), mas queremos ser milhares. Por isso, convidamos as pessoas interessadas em integrar o movimento a procurarem-nos no endereço de e-mail
Recuperar Lisboa está nas nossas mãos.